O Transtorno do Espectro Autista (TEA), que afeta hoje uma em cada 36 crianças, não tem cura e o tratamento adequado pode custar R$ 20 mil por mês. Em 2012, a legislação brasileira passou a assegurar às pessoas diagnosticadas com TEA os mesmos direitos garantidos aos deficientes físicos e mentais. Mas muitas vezes as famílias não sabem como buscar esse direito e, infelizmente, nem sempre a lei é garantida na prática.
Sobre os direitos relacionados ao autismo, acesso à educação e saúde, conversamos com as advogadas Nathália Lacerda e Bruna Gabrielle Tavares. Elas integram a equipe do Instituto Mário Cardi Filho, que presta serviço de assessoria jurídica gratuita, através da advocacia pro bono, a pessoas de baixa renda, com câncer e autismo.
“A legislação brasileira tem avançado para assegurar a educação inclusiva e de qualidade para alunos autistas. Bem como na área de saúde também, a legislação assegura que o tratamento necessário seja fornecido pelos planos de saúde ou pelo SUS, entre outros benefícios. Precisamos que as leis sejam cumpridas e também políticas públicas que alcancem a todos. O autista e a sua família têm direitos, mas a sociedade também precisar querer acolher”, destaca Nathália Lacerda.
Atuando há cinco anos, o Instituto Mário Cardi Filho defende os diretos da pessoa com câncer, e neste ano de 2023 estes cuidados se estenderam às pessoas com autismo. “Além da promoção da cidadania, cultura e difusão de informações, trabalhamos e discutimos as políticas públicas voltadas ao câncer e o autismo, o voluntariado e a advocacia pro bono a pessoas que não tenham condições de arcar com um advogado”, detalha Bruna Gabrielle Tavares.
Nathália Lacerda reforça: “a assistência jurídica gratuita, a advocacia pro bono é uma ferramenta fundamental para ampliar o acesso à Justiça no país. Mas não apenas isso. Ela também ajuda a fortalecer a responsabilidade e a função social da profissão. O serviço voluntário oferecido a pessoas de baixa renda que não têm condições de arcar com a contratação de um operador do Direito. Quando acontece, o atendimento ocorre de forma gratuita e não há cobrança de nenhum tipo de honorário ao cliente, como requisito para defendê-lo em juízo”.
Para conhecer melhor o trabalhado ou se voluntariar basta acessar o site www.intitutomariocardi.com.br. Está localizado na rua Antônio Maria Coelho, 574, Centro Sul, em Cuiabá. O atendimento é feito por agendamento através do telefone 3623-1849.
Confira a entrevista na íntegra:
Bruna Gabrielle Tavares
– A falta de conscientização sobre o autismo e políticas públicas para este público, são desafios significativos para os pais. Como a legislação brasileira respalda a busca por uma educação inclusiva de qualidade para esses alunos?
A legislação brasileira tem avançado para assegurar a educação inclusiva e de qualidade para alunos autistas. Desde a promulgação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e a aprovação da Lei Brasileira de Inclusão (LBI), em 2015, o direito à educação inclusiva é um compromisso legal. A LBI estabelece medidas para garantir a inclusão de alunos com deficiência, como o autismo, em escolas regulares, oferecendo suporte educacional especializado e adequações necessárias para seu aprendizado.
O Instituto Mário Cardi Filho, além de sua atuação voltada para pacientes com câncer, agora também estende seu apoio à comunidade autista.
– A infraestrutura das escolas muitas vezes não atende às necessidades dos alunos autistas. Quais medidas podem ser tomadas para melhorar o acesso e a participação desses alunos no ambiente escolar?
Para garantir o acesso pleno e a participação dos alunos autistas, é essencial investir na adaptação da infraestrutura das escolas. Isso inclui não apenas rampas e acessibilidade física, mas também recursos tecnológicos e materiais pedagógicos que favoreçam o aprendizado desses alunos. Além disso, os educadores precisam de capacitação específica para lidar com as peculiaridades do espectro autista, criando um ambiente acolhedor e promovendo a inclusão social.
– Como os pais podem buscar o cumprimento dos direitos de seus filhos autistas em relação à educação inclusiva? Qual é o papel de um advogado especializado nesse contexto?
Os pais podem contar com o auxílio de um advogado especializado em direitos das pessoas com autismo para garantir os direitos de seus filhos. Um advogado pode orientar a família sobre os direitos previstos na legislação, auxiliando na obtenção de laudos médicos, solicitação de benefícios e adequações necessárias. Caso as instituições não cumpram suas obrigações, o advogado pode ajudar os pais a ingressarem com ações judiciais para garantir o direito à educação inclusiva.
– O Instituto Mário Cardi Filho oferece assistência e orientação jurídica para pessoas de baixa renda em tratamento de câncer. Como o instituto estende seu apoio à comunidade autista?
O Instituto Mário Cardi Filho, além de sua atuação voltada para pacientes com câncer, agora também estende seu apoio à comunidade autista. Reconhecendo a importância da inclusão social e da garantia de direitos, o instituto oferece assistência e orientação jurídica para famílias com filhos autistas. Isso reflete o compromisso da instituição em ampliar seu alcance para causas importantes e sensíveis, buscando uma sociedade mais inclusiva e acolhedora.
– Qual é o papel dos educadores na promoção da educação inclusiva para alunos autistas? Como a capacitação dos professores pode fazer a diferença nesse processo?
Os educadores desempenham um papel fundamental na promoção da educação inclusiva para alunos autistas. A capacitação adequada dos professores não se limita à empatia, mas envolve conhecimento técnico sobre as necessidades e peculiaridades do espectro autista. Professores capacitados sabem como adaptar a didática, criar um ambiente acolhedor e atender às demandas específicas dos alunos autistas, garantindo que eles desenvolvam suas habilidades sociais, cognitivas e emocionais.
Nathália Lacerda
– Além da educação inclusiva, quais são outros direitos e benefícios garantidos por lei para pessoas autistas e suas famílias?
Além do direito à educação inclusiva, pessoas autistas e suas famílias têm direito a uma série de benefícios garantidos por lei. Esses benefícios podem incluir a obtenção de laudos médicos, solicitação de benefícios sociais, redução da carga de trabalho para os pais, isenção de impostos na compra de um carro adaptado, entre outros. Um advogado especializado pode orientar as famílias sobre esses direitos e ajudá-las a ingressar com ações judiciais, se necessário, para garantir o cumprimento desses direitos e benefícios.
– Como deve ser a inclusão do aluno autista na escola? Quais são as responsabilidades das instituições de ensino em relação a alunos com autismo?
A inclusão do aluno autista na escola deve ser cuidadosamente planejada. A escola deve desenvolver um planejamento de estudo individual e oferecer atendimento educacional especializado, garantindo a participação do aluno em todas as atividades. É importante lembrar que a escola não pode cobrar nenhum valor adicional da mensalidade para o aluno com autismo, mesmo para serviços especializados. Além disso, tanto escolas públicas quanto particulares têm o dever de disponibilizar um profissional de apoio quando necessário, sem custo adicional para os pais. A discriminação é proibida por lei, e todas as atividades escolares devem ser acessíveis a alunos com deficiência.
Um advogado especializado pode orientar as famílias sobre esses direitos e ajudá-las a ingressar com ações judiciais, se necessário, para garantir o cumprimento desses direitos e benefícios.
– O que acontece quando a cidade não oferece o tratamento na área de saúde adequado para pessoas com autismo? Quais são os direitos das famílias nessa situação?
Quando a cidade não oferece o tratamento adequado para pessoas com autismo, a legislação prevê que o Sistema Único de Saúde (SUS) deve disponibilizar atenção integral e tratamento completo, mesmo que seja necessário buscar atendimento em cidades vizinhas, iniciando pelo diagnóstico. Se o tratamento não estiver disponível no município, o Estado é responsável por garantir o acesso ao tratamento na rede particular. As famílias podem solicitar judicialmente o acesso ao tratamento, apresentando relatórios médicos que justifiquem a necessidade e urgência do atendimento.
– Como as famílias podem solicitar tratamento pela justiça? Quais são os passos a seguir nesse processo?
Para solicitar tratamento pela justiça, as famílias podem procurar um advogado especializado em direitos das pessoas com autismo. Caso não tenham condições financeiras, é possível entrar em contato com a Defensoria Pública Estadual ou com instituições que prestem atendimento jurídico pro bono, como os Núcleos de Práticas Jurídicas das Universidades. É importante apresentar uma solicitação detalhada do tratamento pretendido por escrito e a negativa do atendimento público ou privado, incluindo a justificativa médica e a urgência do atendimento. Caso a solicitação seja feita por telefone, é necessário anotar o número do protocolo, data e horário do atendimento.
– Os planos de saúde podem recusar cobertura para tratamento de autismo? Como a legislação protege os pacientes nessa situação?
Os planos de saúde não podem recusar cobertura para o tratamento de autismo. A Lei 12.764/12 estabelece que os planos de saúde não podem negar beneficiários com Transtorno do Espectro Autista (TEA) com base em sua condição de pessoa com deficiência. Embora seja menos recorrente, algumas famílias ainda enfrentam dificuldades para conseguir tratamento via planos de saúde. A legislação assegura que o tratamento necessário seja fornecido pelos planos de saúde, e a família pode denunciar irregularidades diretamente para a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).